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sábado, 19 de outubro de 2013

Espaço Homenagem Viva: [ Alcides Celso Oliveira Villaça... ]




Homenagem Viva










Soneto
[ Homenagem para: Yoji Fujyama ]

Alcides Celso Oliveira Villaça
[ Alcides Villaça ]
Campinas - SP

 Do quarto vizinho vem o som
do "Après-midi d'un fane". Sozinho
para os meus estudos e ouço, triste,
a voz de Debussy que me fala
de coisas eternas deste mundo
tão inseguro. Pergunto: "amigo,
tiveste certeza ou antevisão
desta hora solene em que nos
encontraríamos frente a frente
na solidão?" O seu rosto calmo
e claro como as tardes de inverno
por instantes me fita, em silêncio.
Vejo então em seu olhar a flauta
que voa e em puro voo se eterniza.











Viagem antiga
Alcides Celso Oliveira Villaça
[ Alcides Villaça ]
Campinas - SP

 Havia vezes eu me via
como um menino não se vê.
A água na nuvem se adivinha,
a sede vem antes de sua vez.

Havia vezes eu me renascia
sem nunca ter saído de mim:
emprestava-me espelhos e outras vias
de ver tocar sentir o fundo de si.

Era um segundo inteiro ou todo um dia
quando lançava o olhar além de mim
e me via em tudo o que não via?
Que trem cortava o tempo desse abril?

Em que viagem eu era o meu caminho?
Às vezes os meninos pousam olhos
no fim das paralelas, e descansam
o corpo de seus pesos e medidas.

Se nesta noite fixo a luz da esquina
e torno lento o sangue em seu caminho,
nem sombra apanho da viagem antiga
que, quando eu não queria, me fazia.











Rumo oeste
Alcides Celso Oliveira Villaça
[ Alcides Villaça ]
Campinas - SP

 O rádio no carro canta pelas cidades.
Já sei onde está a melhor garapa
de Araras, o melhor algodão em Leme.
Em Pirassununga o hábito do ângelus
ainda veste de santa qualquer tarde.
O locutor e seu melhor emplastro
para curar no peito aquela velha aflição.
Todas as rádios abrem para o mundo
o coração do largo e um recado de Ester:
esta canção vai para W.J.
que ainda não esqueci.
O céu de todas as rádios
se estende para a capital: o que se dança
em New York direto para São Simão.
Para você, Lucinha, mexer o que Deus lhe deu.

A velha teia das cidades
enleia agora as estrelas.
Ao som da sétima badalada
do coração da Matriz
desligue o rádio! e respire
de passagem tudo o que fica:
são ondas soltas no ar.











sobre viver
Alcides Celso Oliveira Villaça
[ Alcides Villaça ]
Campinas - SP

 quando esses pássaros
atravessam o peso da cidade
e batem contra os muros
no viveiro gigante e invisível
as asas e as penas que não caem
são os peixes do mais fundo dos rios
são as folhas do mais alto das árvores
e as nuvens que sem reclamo
suportam a massa azul











Lampejo
Alcides Celso Oliveira Villaça
[ Alcides Villaça ]
Campinas - SP

 Ela só queria um abraço.
- Só um abraço, ela me disse.
Assim dizendo me enlaçou
como sucede nos abraços.

E se despediu contente,
e com leveza partiu,
levando o abraço consigo
e me deixando abraçado
naquele abraço partido.











Lembrança
Alcides Celso Oliveira Villaça
[ Alcides Villaça ]
Campinas - SP

Saudade não sei de quem
mas que por certo não houve
em sua exata medida
daquilo que nunca coube

Fato assim tão existido
que existiu além do fato;
cara perdida sem cara
numa ausência de retrato

Beijo a nascer primeiro
que seu dono, envelhecido
nos lábios de algum fantasma,
única forma de vida













 

Pai
Alcides Celso Oliveira Villaça
[ Alcides Villaça ]
Campinas - SP

 Foi tudo tão depressa, na dobra
de um paletó que repartimos.
Teu passo vertical cavava fundo
no peito, meu pudor.

O ponteiro grava a distância que ficou
entre os braços, flash imprecípite.
Um estreito nas rochas, sem fio a correr
e sem tempo. Caímos, sem tocar-nos:
deuses antiamantes.

E de repente permanecemos.
Somos os mesmos impossíveis
de há tantos séculos. Já fica um adeus
para a hora extrema [enquanto esta vigília
prossegue em noite densa].

Sou nome de teu menino, a última foto
grafia
Babei em tua barba, puramente meninos
os que se acariciavam com armas distintas.
E juntos prosseguíamos num eterno afastar-se;
da quanto mais distância
mais altos nós nos víamos.

Sem tempo, tão pequenos na bússola
que perdemos,
convém não, pai, que dores comuns
nos aproximem.
Fica lá em tua infância
e eu na minha velhice. As auroras
sabem o tempo de pousar.

Te seguirei como sempre
sempre paralelamente
a par de todos teus frêmitos
desenhando todos os golfos
acelerando nas retas
não te perdendo de vista.

E de vez em vem, um morse
tamborilado no peito
para aferir a distância
e o jamais do tempo. Amém.











Quatro pegadas
Alcides Celso Oliveira Villaça
[ Alcides Villaça ]
Campinas - SP

 por um amigo não saberia morrer
mas saberia viver
por um amigo

para que sua palavra morta
escalasse ainda o gosto
de minha língua

e por ele degustasse
a sede de nossas
águas

e permitisse pela pupila
certos signos
precisos

e quando prontos ao silêncio
todos dessem
pelo seu

e entre os convivas
deixasse
quatro pegadas











Tempos
Alcides Celso Oliveira Villaça
[Alcides Villaça]
Campinas - SP

 O tempo chega em torturas
vizinhas.
Não é o balde na cara
não é o choque
o vergão.

É o seu chicote de vazios máximos
a desconfiança
a descompanhia
medo do front voltando em remorso
sobre ombros brancos tensos de cautela.
É o cismar na rede seu sono de malhas
que marcam as costas com suavidade.
É o virar na rede sem sono e sem soltos
campos de nostalgia antiga.

O tempo chega em torturas
vizinhas.
Sem aviso algum, sem noção de tempo
toma conta de nós nos mini-desconfortos,
na varanda sem sombra, no terraço sem sol,
no mercado sem frutas, na partida sem gols.

O tempo se recolhe à casa
e quer nos consolar dormindo em nossa cama
com promessa e afagos.
Fingimos dormir. De lado,
na solidão do quarto, a insônia
reluz na sombra e a vigília preserva
um tempo em meio ao tempo.







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